sexta-feira, 22 de abril de 2016

A Ontologia do Jogo Reversi


Há uns dias eu estava pensando como seria legal casar algumas noções que encontramos dentro do jogo Reversi com algum escopo filosófico para facilitar (ou talvez não) a compreensão de alguns paradigmas intrínsecos ao jogo. Pois bem, todos sabemos que no final do século 19 nasceu ao menos dentro do conhecimento oficial, o nosso queridíssimo jogo lá no velho mundo, lá na terra da Rainha, a sempre inovadora Inglaterra. Não se sabe como aqueles pioneiros jogavam, quais eram as suas técnicas, quais eram seus primeiros pensamentos mais aprofundados em torno do jogo, mas talvez até mesmo com um certo nível de segurança, eu posso assegurar-lhes que deviam no geral, usar conhecimentos e compreensões deveras diferentes das que utilizamos hoje em dia, num mundo dominado pela tecnologia e digitalização dos meios, no advento da ciência computacional e progresso da Inteligência Artificial as nossas experimentações do mundo, dentro dessa era pós-moderna é diferente da clássica em muitos aspectos, e não poderia ser diferente dentro da mente dos jogadores antigos, vejamos o porquê.

Pulando quase um século de história e ignorando o total hiato e obscurantismo do qual o jogo Reversi entrou, cheguemos ao ano de 1977, apenas meia dúzia de anos após a reconfiguração do jogo e de todo o marketing publicitário no relançamento do jogo, que surgira agora com um novo e shaskepereano nome: Othello. E foi nesse ano que em Tókio acontecera o primeiro campeonato mundial de Othello, e logo de cara foram dois mundiais num ano só! Mas foquemos a esse primeiro, onde o japonês Hiroshi Inoue fez a grande final contra o norueguês Thomas Heiberg, o batendo nas duas partidas sem lá grandes dificuldades. Pois bem, aquela era uma época em que ainda não haviam os ditos programas de Reversi com a força que conhecemos hoje, os poucos que tinham era demasiadamente primários, como era o que ficou conhecido como o primeiro programa de Reversi já criado, o IAGO. Os jogadores no geral tinham que aprender tudo sozinhos e copiando uns aos outros para tentar melhorar o próprio jogo, o que fazia com que essas partidas se modelassem de uma forma bem diferente dos padrões modernos, mas o porquê disso? O ser humano é um ser social, ele é quase que 100% copia e execução, foi assim que progredimos como espécie durante milhares de anos, e é assim que aprendemos nos dias de hoje, seja para o aprendizado de nossa língua, em como se dirigir um carro, aprender sobre engenharia espacial ou fritar um ovo, o ser humano necessita de outros seres humanos para aprender as coisas, caso contrário até aprenderia coisas básicas, mas a passos de tartaruga. Nessa partida do que foi a grande final do mundial, o torneio de maior prestígio dentro do mundo do Othello, vimos dois bons jogadores, mas ainda assim ambos não muito diferentes de jogadores que nos dias de hoje estejam aprendendo a jogar Reversi, e que com pouco esforço cheguem àquele nível dos dois na década de 1970, ou seja, os meios hoje em dia são mais favoráveis a esses humanos copiarem e executarem seus aprendizados. No decorrer de mais 10 anos, no mundial de 1987 vimos um certo progresso em comparação ao nível dos jogadores de 1977, por que isso? Opa meu amigo, mas ai já haviam softweres táteis  e programas integrados em computadores capazes de derrotar um ser humano, dos programas portáteis eu posso citar dois em particular, que também foram criados pela Tsukuda (a mesma marca que relançou o Reversi em tabuleiro, o Othello) que seriam o Clementoni Othello Elettronic Box e o Tsukuda Othello G5, não eram programas fortes, mas já ajudavam. E por meios digitais o magnífico The Moor, que em 1981 derrota o bicampeão mundial de 1977 e 1979, o dito cujo falado acima, Hiroshi Inoue. Ou seja, nessa época os seres humanos com sua capacidade de máquina de xérox estavam já aos poucos remodelando sua forma de jogar, agora não era mais necessário beber da fonte jogabilística humana, agora o sabor eletrônico parecia mais ácido e vigoroso. Muito bem, no campeonato mundial de 1997 a coisa já estava bem avançada, nesse ano empresas como Microsoft já haviam se adentrado pela facilidade e o prazer recompensáveis que era poder criar programas de Reversi, e lançou em sua plataforma o jogo embutido no Windows 3.0, até mesmo empresas de videogame como a Atari lançou a sua própria versão do jogo Reversi, e os programas estavam a todo vapor, havia até mesmo em 1993 uma plataforma virtual onde programadores poderiam entrar com seus programas e digladiarem com programas de outros programadores, a IOS (Internet Othello Server) plataforma essa criado por Igor Durdanovic, foram nesses anos que também surgiram livros sobre o jogo como o “Othello: Brief & Basic” de Ted Landau e o “Othello Par L’Exemple” escrito por vários jogadores baseado em partidas do mundial de Paris na França em 1988, se um jogador quisesse aprender, ele não teria como não aprender dentro de um terreno tão fértil.

Porém, desde 1997 até os dias de hoje a coisa toda não andou muito mais rápido, com a falta de descobertas matemáticas e programabilísticas que fomentasse e desse um acicate no entendimento do que é um sistema de busca bruta (Alpha Beta Poda, Heurística, Minimax), os jogadores estranhamente também pararam de progredir, temos uma miríade de jogadores, um grande contingente de estilos e performances, mas nada que digamos “Oh, como isso?”, o entendimento sobre o jogo deu uma empacada nas últimas duas décadas, mesmo com o advento dos aplicativos de jogo dos smartphones  e plataformas de dowload como a Google Play (Android) e iTunes (iOS) sou obrigado a assumir que muito se deve a copia e cola das mesmas jogadas que também são ensinadas nesses aplicativos, alguns jogadores magistrais como Ben Seeley ou Yusuke Takanashi ou até mesmo os criativos Arthur Juigner e Nicky Von den Biggelaar têm insights maravilhosos nas partidas dos quais nos deixam embasbacados, mas quase nunca fogem de jogadas que se pegarmos para estudar, veríamos que está dentro daqueles limites estipulados pelo leque humano aprendido e pelos ensinamentos capturados de softweres especializados. Ou seja, a máxima do filósofo alemão Martin Heidegger faz todo o sentido: “Nunca chegamos aos pensamentos. São eles que vêm.”

O jogo Reversi na sua forma oficial, 8x8 ainda não tem uma solução, o número de jogadas legais é de dez elevado à vigésima oitava potência e a árvore de jogo é de cerca de dez elevado à quinquagésima oitava potência, ou seja... Se é insolúvel para programas fortíssimos, quiçá para nós meros humanos. É nessa hora que adentramos em ideias abstratas como ao da fenomenologia do filósofo prussiano Emmanuel Kant, que diz que só o que podemos conceber através do uso da razão é o que experimentamos, há um todo intocável, intangível e invisível em sua real forma a nós humanos, ou seja... Seja lá o que for o jogo perfeito, só o que conseguimos conceber é aquilo que nos auto-ensinamos através de nossas vivências, e concretizamos aquilo que através de uma manipulação entendemos ser útil, então o julgamos verdadeiros. Se você leu a minha última postagem onde falo sobre a obsessão ao padrão, ainda mais nas aberturas de jogo, você entenderá o quão benéfico foi a criação dos ditos sistemas  XOT, onde uma plataforma cria aleatoriamente aberturas matematicamente equilibradas das quais você dará continuidade com seu adversário humano. Antes disso, acredito eu que deveria ser algo a contar nos dedos de uma só das mãos os jogadores que saíam daquelas aberturas já manjadas e ditas seguras pelos programas desde a década de 1980, ou seja, esse novo sistema deu um novo insight aos jogadores dos quais gerarão bons frutos lá na frente dentro do entendimento do jogo como um todo.

Bom, para finalizar eu fico aqui pensando, eu e minhas conjecturas sobre as possibilidades que ainda irão ser descobertas (ou virão até nós como diz a máxima de Heidegger) em torno do jogo Reversi, ainda estamos trilhando um caminho desconhecido, que será talvez finalizado lá bem na frente dentro do tempo, por novas mentes criativas e curiosas, que ajudarão a formar jogadores de um nível nunca antes visto, é esperar para ver.

Hoje meu blog faz 7 anos de idade, então resolvi trocar uma ideia aqui com vocês, até a próxima. :)

Alguns dos jogos dos mundiais de 1977 até 2015.

1977 (Jogos da Final)


Hiroshi Inoue 34 - 30 Thomas Heiberg: F5D6C3F3F4D3C4G6F6E6C5C6D7D8E7G5E3D2G4H3F7B5H5G3B4B6C8B8C7E8F8G8H4H6E2D1C1A3A6A5E1F2G7C2A4H8A2B7F1B3B1B2H7A7A8A1G1G2H2H1

Hiroshi Inoue 45 – 19 Thomas Heiberg F5D6C5F4E3C6E6F3D3F6G4C4B4A3B5E2D2H4C7B3C3A6D7D1C1C2E7B6E1F1G1F2B1C8A5A4D8E8B7A8B8B2A1A2G5H5G3H3A7G2H1H2H6G6H7G7G8H8F8F7



1987

Peter Bhagat 21- 43 Ken‘Ichi Ishii:  F5F6E6F4G5E7F7H5E3D3F3D6C7C5D8G6H4H3C6G4G3E8F8C4D2C2B3B5D1C3A5D7E2B4B6A3H7H6H2B8A4A6B2A2G7E1C1F2G2F1G1H8G8C8A7A8B7H1B1A1

Karsten Feldborg 37-27 Brian Rose :  F5F6E6F4E3C5C4E7G4G3G5F3E2H6D7D6E8H4G6F7F8C8H3H7B5F2F1A5B6C7C6D8B8C3A4D2D3A3C1C2B4B3A7D1E1H2H5G2B1G8H8G7A2A6B7A8H1A1G1B2


1997

Graham Brightwell 38-26 David Shaman :  F5D6C3D3C4F4C5B3C2E6C6B4B5D2E3A6C1B6F3F6F7E1E2G5D7E7G4C7H6F1G6H3H5G8E8G3D1B1F2G1D8C8B8B7A8A7A5H4H2A4A3F8H8B2A1A2H1G2G7H7

Makoto Suekuni M. 20-44 Emmanuel Caspard :  F5D6C3D3C4F4F6F3E6E7D7G6D8C5C6C7C8B6E3F8E8B8B5G5A6F7G4B4B3E2H5H3D2F2H7H6E1B7A8H8H4G3F1C2D1A4G8A3A5B2A2G7G2A1B1A7H2H1G1C1

2007

Stéphane Nicolet 27 – 37 Kenta Tominaga

c4e3f4c5d6f3e6c3d3e2b5c6d7f6g6f5b4e7f7a4g5g4h3h5g3h6h4h2a3a6b3c2a5a2d2c1f2e1d1f1g2c7b2h7b6a1b1c8d8a7b8e8f8h1g1g7b7a8g8h8

2015

Yusuke Takanashi 36 – 28 Makoto Suekuni

f5d6c3d3c4f4f6g5e6d7e3e7g3c5b6b5c6b4c7b3d8a6h6c2e8g4g6f3h3f7f2f8d2d1e2e1a3f1a5b2a1c8g7h4h5h8h2h7b1h1c1g2g8a7a8a2b8b7g1a4

Não sabe colar as transcrições no WZebra? Então aprenda aqui nessa minha outra postagem, link mais abaixo:

http://othelloclassic.blogspot.com.br/2010/06/wzebra-o-modo-para-se-seguir-as.html

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