segunda-feira, 15 de agosto de 2022

Paulo Kitada




Entrevista com:


Paulo Kitada



Introdução: 



Paulo Kitada é um amante dos esportes da mente, começou a jogar xadrez por volta dos 13 anos de idade, e hoje tem se dedicado a ensinar sobre vários jogos de tabuleiro em escolas públicas de Suzano, área metropolitana da grande São Paulo. De 2017 em diante Paulo Kitada vem se dedicando a ensinar nas escolas e disseminar em seu canal no YouTube, sobre nosso tão amado jogo Othello.


OC - Olá Paulo, como conheceu o jogo Othello?


Paulo Kitada - O jogo acabei conhecendo sem querer, pois como possuía um Super Famicon (vídeo game da época) para distração, comprava vários cartuchos de jogos que eram baratos na época, comprei o de othello e foi um dos jogos que mais jogava na época, em 2015 voltei para o Brasil e nem imaginava que já existia uma federação brasileira.


OC - Sei que esteve um tempo morando no Japão, como era para você ter morado no país do jogo, conheceu algum jogador por lá?


Paulo Kitada - Morei no Japão por 20 anos, meu objetivo na época era continuar estudando o xadrez e voltar disputando o paulista, mas, o tempo foi passando e não via mais como prioridade e para não ficar parado, aprendi o shogi (xadrez japonês). O othello na verdade era apenas uma distração e como não me aprofundei no jogo, acabei não me aprimorando e nem conhecendo jogadores e hoje, jogando de forma como aprendiz, posso falar que me arrependo de não ter desenvolvido o jogo no país do sol nascente, momentos da vida, pois moro no país do futebol e não jogo bola...morei no país do othello e também não jogo bem.


OC - Há paralelos da forma como os japoneses tratam o jogo em relação de como o jogo é tratado por brasileiros?


Paulo Kitada - Sim, para você ter uma idéia, jogos como Shogi e Go são transmitidos todos os domingos na tv aberta, todos com transmissões ao vivo, análises de especialistas e comentários. O othello já houve várias e várias matérias em tvs abertas, com os melhores do Japão e mesmo com alunos.


     Qualquer tipo de torneio, principalmente onde as promessas estão presentes, são gravadas e arquivadas pelas emissoras.


     No Japão, esses jogos são difundidos até em vídeo-game, um dos fatores na qual aprendi o Othello.


     Para mim, um dos principais fatores é: os principais do país ensinam, estudam e fortalecem a base e por esse fato, temos entre os top 100 do mundo com vários japoneses dentro desta lista.


     Talvez você me pergunte o porque não temos japoneses entre os tops do xadrez? Porque lá não é difundido o xadrez, pois poucos jogam e acho que por esse motivo, vários se dediquem ao shogi, sendo que essa transição aconteceu comigo.



OC - Você é professor em escola pública e particular em Suzano, aqui em São Paulo, vê algum projeto relacionado ao jogo em Suzano?


Paulo Kitada - Uma pergunta interessante, mas, começamos com alguns obstáculos relacionados a Cidade de Suzano e região.


     a - Tenho que enfrentar primeiro a grande propaganda disseminada no Brasil sobre o xadrez, sendo que temos blogs, matérias na internet, GMs, destaques, torneios de base, torneio de menor porte até de grande porte, etc. Enquanto isso se compararmos somente no Youtube, quantos canais temos sobre o xadrez e quantos temos de Othello?



     b - Pelo que eu saiba, sou o único da região a ter o Othello na grade de aulas. O mais próximo, se não me engano, fica em Guarulhos, diferente do que aconteceu na cidade de Criciúma - SC, onde várias professoras se uniram para difundir o jogo na cidade através de um Clube de Matemática.



     c - Temos um mapa geográfico desfavorável.


Exemplo: Suzano - Guarulhos (sendo que não posso de confirmar se há aulas relacionadas) 40 km


     Suzano - Indaiatuba: 150 km


     Suzano - Monte Mor: 165 km


     Suzano - Criciúma: 940 km


Porque da comparação com essas cidades? Atualmente são os principais polos de base do Othello.



    d - Além do mapa geográfico desfavorável, temos a falta de torneios de base, sendo que, posso realizar torneio municipal, mas, meus alunos estão distantes 30 min sobre veículo motorizado.



     Apesar de estar sozinho na região, não desistirei tão fácil em ensinar e quem sabe ter pelo menos um top 10 brasileiro.



OC - Noto que de dois anos para cá tem se dedicado mais ao jogo, tendo criado até mesmo um canal para transmissão de jogos online ao vivo e participou de projetos como tutor de alunos de Criciúma em Santa Catarina de forma remota, o que pensa ser o ideal para alavancar a divulgação e disseminação do jogo no Brasil?


Paulo Kitada - Poderíamos simplesmente copiar o xadrez, sendo que vários jogadores de Othello, vieram do xadrez (eu também).


     Mas o que é copiar o xadrez? divulgações, vídeos tutoriais (temos apenas um canal), torneios com premiação em dinheiro (sei que não é fácil, mas temos empresas grandes dispostas a investir em educação e esportes).



     História: quem são os grandes jogadores de Othello no Brasil? Só temos os de São Paulo?


     Muitos não sabem que temos excelentes jogadores fora de São Paulo.


     Amazonas, Pará, Pernambuco, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Espírito Santo, etc.


     Sem história, você não tem referência, não tem a quem se espelhar, a quem copiar o estilo e o principal, deixar no esquecimento o que já foi construído.



     Unir forças: um campeonato brasileiro com todos os melhores do Brasil, para mim, faria história, mas nem no online isso é possível, imagina no presencial.



     Mudar a cultura: "eu sei, sou o melhor e o resto que se vire"


     Se não mudarmos esse tipo de pensamento, nunca teremos uma geração forte, mas creio que esse tipo de pensamento, está mais ligado à professores (as) do que especificamente a atletas.



     Lembrando que são apenas pensamentos distantes, pois não depende de mim.



OC - Qual é na sua opinião a maior barreira que o esporte enfrenta atualmente para conseguir angariar novos jogadores e educá-los a atingir um nível de qualidade competitiva?


Paulo Kitada - A maior barreira é quando você fala que joga Othello e vem a clássica pergunta: O que é Othello?


     Por esse motivo já se percebe que o esporte demorará décadas para talvez se tornar conhecido.


     Não temos o mesmo incentivo que o xadrez tem, significa que o xadrez é bom para o desenvolvimento intelectual e concentração dos alunos e porque o Othello também não tem essa fama, pois é um jogo de raciocínio lógico?


Diante disso, não temos o mesmo incentivo que o xadrez tem para se tornar matéria escolar ou mesmo ser integrado na grade de alguma escola, então, mesmo que você consiga adeptos ao esporte, ele nada mais deixará de ser um passatempo, joguinhoou algo a se aprender um pouco mais profundo, pois, nem nos torneios realizados em alguns lugares, a organização não leva a um patamar sério, competitivo e respeitoso.



     Não adianta eu tentar divulgar o esporte na minha cidade, se outros com mais experiência fazem um torneio amador bagunçado.


     Querendo ou não, isso espanta futuros interessados e se você não tem interessados, não tem torneio, se não tem torneio, não se tem competividade e assim entramos em um efeito dominó.



OC- Sei que você não é um adepto da leitura, em um universo em que livros eram tudo que tínhamos para aprender estratégias no Othello, na sua opinião, o que pode ajudar jogadores a atingirem uma maestria além dos livros?


Paulo Kitada - Os tempos mudaram, hoje é mais fácil você encontrar "livros" em pdf, significa, a leitura não entrou em extinção, mas como eu, um cara preguiçoso para ler, fiz adaptações de outros métodos sem ser a leitura.


     Hoje em dia temos o seu próprio canal no Youtube, mas, a base principal dos alunos, são primeiramente seus professores. Somos nós que temos que nos aperfeiçoar antes, ensinar o correto, pois se ensinamos alguma coisa errada o aluno nunca poderá debater esse erro com o professor.



     Mas porque eu falo primeiramente no professor? Como vocês sabem, sou professor aqui em Suzano e com o tempo e jogos, percebi que havia alguma coisa errada com minhas estratégias.


     Depois de vários conselhos e derrotas, demorei cerca de 2 anos para ver que tudo que eu sabia, estava completamente errado.


     Fiz uma reciclagem total e hoje posso te dizer que ensino de uma forma diferente do que foi me passado.



    Temos que ter cuidado com vídeos postados na internet, a principal ferramenta pós livros.



     Resumindo: temos poucas opções na internet em português, mas para quem quer se aprofundar no esporte, temos o canal do Fabrício Silva, fora isso, melhor procurar vídeos de outras federações, como a espanhola, italiana, britânica e a japonesa.



OC - Haveria alguma possibilidade da prefeitura de Suzano implementar o ensino do jogo Othello nas escolas através de algum projeto paralelo assim como é feito lá na cidade de Criciúma em Santa Catarina com os clubes de matemática?


Paulo Kitada - Acredito que não.


Primeiramente sou o único da região.


Segundo, Criciúma uniu forças e pelo que eu saiba, são no mínimo 10 professoras unidas nesse projeto ( creio que passe de 30).


Terceiro, a cultura de lá, é diferente daqui.


Quarto, Suzano não implementa nem o xadrez, imagina othello que quase ninguém conhece aqui.


Quinto, qual cidade de São Paulo se preocupa no desenvolvimento intelectual das crianças?



OC - Você disse que teve que "desaprender" o jogo Othello e reaprendê-lo, e salientou sobre a perniciosidade de materiais do jogo difundidos na Internet com conceitos errados, estratégias irrealistas, você pensa em fazer algo por conta própria para ao menos deixar o material em português disposto na Internet aos iniciantes mais realista para o que será exigido lá fora, no mundo real dos jogadores intermediários e de alto nível de Othello?



Paulo Kitada - Não....motivo: não tenho conhecimento tão profundo do jogo, e mesmo que se eu quisesse, já tem o canal no youtube do Fabrício Silva, onde há vários vídeos, desde principiantes para os mais experientes, então, para meus alunos prefiro recomendar o canal dele e fazer o ensinamento básico e também não vejo motivo para se ter 2 canais em português com os mesmos ensinamentos, pois muitas estratégias aprendi lá.



OC - O que você acha que falta para que os grandes jogadores de Othello no Brasil tenham interesse em participar de eventos, seja online ou presencial, seja oficial ou extraoficial?


Paulo Kitada - Premiação em dinheiro.


Você é obrigado a viajar para certos lugares e saberá que não haverá compensação financeira, então, vou se der, se estiver com tempo, se estiver com vontade e se terei grana para a viagem.


A maioria irá por amor ao jogo, pela disputa e fora isso, você terá apenas uma medalha no peito e talvez nem divulgação terá.



OC - Agora mudando um pouco de assunto, como bem explanado por você, no seu caso sua origem nos jogos mentais foi no xadrez,  depois shogi, apesar de já conhecer o Othello desde a época em que morava no Japão, foi só agora que se dedicou um pouco mais ao jogo; você sente que a base de cálculo exigido nesses outros jogos é similar ao Othello ou o jogo Othello é mais fácil mesmo de dominar?



Paulo Kitada - Pergunta difícil....rs....bom, eu não chamo de "base de cálculo", mas sim, "visão espacial", só que alguns falarão que é a mesma coisa.


Pra mim não é, se você não tem visão espacial, automaticamente sua base de cálculos é limitada, porém, todos os jogos entram em padrões de jogo, mesmo você achando um padrão parecido que requer 4 lances para definição, como achar esses lances se sua visão espacial é limitada a 2 lances?



Teoricamente o Othello é mais simples de se jogar, mas creio que exige uma visão espacial que não pode ser limitada a 2 ou 3 lances.



Se pensar dessa maneira, eu já seria mestre em Damas, pois se usa somente a metade do tabuleiro.




OC - Agora fique mais à vontade ainda para colocar toda a sua visão do que acha que será o Othello no Brasil e de como você se vê fazendo (ou se se vê) disso tudo no futuro.


Paulo Kitada - Se unirmos forças hoje para desenvolver o Othello no Brasil, para futuramente poder ser competitivo mundialmente, creio que levará uma década.



Porque do pessimismo? simples, somos amadores e mundialmente há um jogador brasileiro temido por outros competidores?


Somos o país do futebol, do vôlei e alguns na água (natação em geral).



Em esportes da mente, temos somente o Mequinho da década de 70.